AGOSTO 2010

cafésolo

domingo, 2 de agosto de 2009

IMAGEM, A PRETO E BRANCO



Sentado na soleira da porta, procura sentar-se numa
posição de equilíbrio, no desequilibrante mundo
que o obriga a usar o velho cajado. Serve-lhe de amparo,
acompanha-o na sombra dos movimentos,
desde o primeiro susto e queda.
Não estranha por isso a vida nem a etapa que vive.
Nas memórias que comporta d'outros tempos
(de rapaz novo) resta-lhe a nostalgia dos bailaricos
e namoricos com moças de tenra idade, da sua geração.
Vive um dia de cada vez, sabe de onde vem e ao que vai,
não pretende atropelar os dias que lhe restam,
vai apenas degustando cada imagem,
cada cena nova que se lhe depara.

Nada há a mudar no seu defeituoso feitio,
nasceu e cresceu assim, rezingão e teimoso,
fazendo uso do seu bigode grisalho
sempre que a pretexto, valha a pena.
O facto de usar uma bengala tosca, não lhe retira
nem um pouco a pose que ostenta do alto do seu trono.
A sua focagem é seca e ríspida, sem contemplações
para com as gerações que o ultrapassam agora sem sentido.
No alpendre da sua casa, conhece bem aquilo que o espera,
as ilusões não sobrevivem, não é mais enganado pelos sentidos,
sabe que a morte é provavelmente o seu último refúgio,
o único trajecto que iniciou verdadeiramente,
a derradeira escalada que nos toca,
quase sem dar-mos conta.

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4 comentários:

  1. Ai Miguel este poema é inspirado em alguem k conheçes bem ja k depreendo k ainda estás em Macedo!!! sensacional :)))

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  2. Adorei! Na mesma linha daquele outro que escreveste há tempos (talvez o hoje à tarde foi assim, já vou confirmar). Keep on the good work!

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  3. Ups, afinal é o "Éden, por uns segundos" e não o "hoje à tarde foi assim"...

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  4. Alma Serena

    Alma serena, a consciência pura,
    assim eu quero a vida que me resta.
    Saudade não é dor nem amargura,
    dilui-se ao longe a derradeira festa.

    Não me tentam as rotas da aventura,
    agora sei que a minha estrada é esta:
    difícil de subir, áspera e dura,
    mas branca a urze, de oiro puro a giesta.

    Assim meu canto fácil de entender,
    como chuva a cair, planta a nascer,
    como raiz na terra, água corrente.

    Tão fácil o difícil verso obscuro!
    Eu não canto, porém, atrás dum muro,
    eu canto ao sol e para toda a gente.

    Fernanda de Castro, in "Ronda das Horas Lentas"

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