AGOSTO 2010

cafésolo

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

estanque
















Revelavas por princípio 
uma relação difícil com as palavras.
Sob um primeiro olhar lince,
transformavas a ideia que os olhos viam
por algo que se quedasse entre muros,
a certeza estanque, na robustez do aço.

Uma espécie de alusão térrea
e tão própria
como a distância fria dos números.

E eu estava ali por perto,
disposto a amar-te
junto à lisura das mãos.

Observava-te devagar, como o tempo
colhia dos frutos as outras partes de nós,
uma distância urgente entre medos
que tão sabiamente nos sabiam notar.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

eléctrico
















Confesso, devo confessar que não
sei ao certo por onde deva começar.
Dizer talvez que cheguei a tempo
de parar no tempo a fotografia
____________________[que fiz?
Que tiraste dos óculos o sol
que nos aproximaría depois?
(Essa foto - julgo - tê-la tirado.)
Dizer que nos sentamos frente-
a-frente e que o rapaz de avental
não soube trazer o gelo do outro
tanto que escreveríamos depois?
Que atravessamos juntos a tarde
desde o azul das janelas, até ao
fim da claridade entregue ao mar?
Curioso é ver como as varandas
se combinam entre nós (desde 
o primeiro fim de tarde na praça).
Gostei de rever o teu rosto junto
ao poema - esse olhar que me fala    
                                            [quase -
eléctrico & gin Gordon's, tête-à-tête.

Confesso, devo-to confessar.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

preâmbulo


















A vida é como um poema lançado ao acaso.
Há poemas que não lemos por nada & outros
que nos chegam, sob as mais estranhas formas
de "encomenda". Há gente que nos permite
entrever o caminho, uma espécie de tela
                                                         [e tinta rara.

Outras vezes, o olhar esquivo é suficiente
para obtermos dos lábios o incontornável
desequilíbrio. O mesmo que nos sujeita
depois – tal como alienados em fuga ­–
à sorte perdida – diante dos filamentos
                                                [das mãos.

Um terraço, um quintal, as traseiras da casa,
uma mesa posta ao convívio de rua; o vinho
que provas e se prende na boca desde um
primeiro gole; são as legendas possíveis,
no mau agoiro – de um peito que tomba ­–
ao ricochete das balas. E este, claro está,
é sempre o pior recomeço: no rasto  
                                             [dos teus versos.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

um quase nada
















Mas vejam-me o vazio
de um cinzeiro sem chama;
ou a mesma razão que serviu
ao escancarar da porta
que se fechava
à vinda dos outros.

Vejam-me o mote
usado e tão fraco
dos pêlos do gato,
apagados depois
à janela encerrada
na vinda do pó.


A sombra escura
nas olheiras cavadas
a luz de um dia
que afinal mal vês.


Desânimos estendidos
pela sorte dos vizinhos
& um cigarro aceso
num rosto sem luz.


E há uma noite
que se acende
outra vez.
E é sempre noite em ti.


Renasce um sol
pelo teu sorriso
na mesma vontade
que ousas dizer.


Reacendes um desejo 
na rua aberta por nós;
& não há lugar a lamentos
– madrugada fora –
porque a noite é tua,
de mais ninguém!


E voltas
para usar as palavras,
a troco:
de um quase nada.

domingo, 12 de setembro de 2010

volta dos tristes



Acabo de regressar da volta
dos tristes. Procurei na cidade
ou da cidade – não sei bem  –
a sombra das coisas, o influxo
do corpo. Havia gente despida
em corpos redondos, um resto
de verão despedaçado entre
o frio geométrico das mãos.

A antítese presente em cada
rosto, o olhar perdido no ferro
dos Homens. É-nos tão difícil
deixar o corpo entregue à roleta
da sorte, na deriva incauta dos olhos.
Será demasiado tarde para resumir
o sorriso dos outros? O breve
& amargo sabor destes versos?

O cigarro adiado foi o rastilho,
o impulso quase perfeito. A mão
que se solta e disfarça tão mal
a nossa ausência. Porque será
que tardas no teu regresso?
Porque será que insistes incluir
a purga da tua ausência
na boca do meu silêncio?  

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

de um cinza chuva



Eles vinham de longe, diziam os mais
incautos & apressados corpos na cidade.
Chamaram-lhes de outono em seus abrigos.
Os dias vestiram-se breves, embalados numa

espécie de ritmo granítico sob a pedra
coçada, ainda mais densa que a precipitação.
Era o peso de um retorno a um cenário cinza
ainda mais raro; tão intempestivo quanto
__________________________ [indecifrável.