AGOSTO 2010

cafésolo

quarta-feira, 18 de maio de 2011

#cenário 1


















O cenário é um café onde se permite fumar.
Há um último cigarro que fumega apressado
num cinzeiro meio cheio ao centro da mesa.
De fronte para o grande vidro da entrada vai
levantando um semblante distante, como que
a contar o resto das cabeças que resistem à hora
marcada. Escreve compenetrado a espaços num
bloco negro, que acomoda de quando em vez
de mão solta, é canhoto, é certo, e os seus
óculos disfarçam a barba que traz por desfazer.

Dão-lhe um ar de qualquer coisa, como direi:
séria, os óculos que usa. "Deve ler que se farta"
comentam as tipas da mesa ao lado, um pouco
antes de zarpar. Avançam por rasgados sorrisos
rápidos que as levam (por gargalhadas, mesmo!)
de encontro a um destino seu, sob o olhar atento
daquele que agora parece ser um poema que fuma
(outra vez). Parece ter uma certa compassividade
eléctrico-compulsiva, se calhar também perde algum
tempo com os versos, ou talvez não, não sei bem.

Há algo de estranho nesta personagem que me faz
ficar alguns minutos mais (ou aqueles que sobram
ao meu próprio fado). Lá fora observo outra gente
que se movimenta numa quebra de ponta na cidade.
É a minha deixa e com ela me levanto também, mas
creio que ainda ficaram umas 10 ou 12 cabeças (se é
que os moços do balcão também contam, no improviso
da contagem). - É estranho ou mesmo raro ver-se gente
«perdida», penso, ou então, eu é que perco demasiado
tempo a observar cenários daquilo que deambula por aí.

1 comentário:

  1. E como é bom perder assim o tempo, recuperando-o em palavras para quem (talvez) "lê que se farta" sem nunca se fartar de ler.

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