AGOSTO 2010

cafésolo

terça-feira, 24 de agosto de 2010

café central


















Visto desde longe, é como se tivesses
enfileirado a favor dos trilhos do futuro.
Já não vendes tabaco avulso ao balcão,
mas albergas um enorme sorriso, e as cores
de um tecido que me desatenta como o verão

[o leitor que me perdoe este pequeno desvio].
No "central" já não respiram os painéis marron
a imitar ancestrais figuras agrícolas de parede,
degredadas desde sempre, desde o tempo que 
se cravou no largo o busto & o respeito pelos
____________________________[segadores,

pelas suas figuras de aço, uma história de pedra,
talvez esquecida pela modernidade da praça.
Visto de longe, é como se este café central
[igual aos demais] nos permitisse agora voltar
ao tempo onde pudemos observar [privilégios

dessa imensa & emotiva peça] seus semblantes
vazios, sentados no emaranhado histórico de uma
mobília escura, a madeira singular de uma África
de século XX. Rever [ainda que por breves instantes]
certos olhares, transportes sinistros em homens típicos

& desaparecidos; rever suas figuras nítidas de domingo,
seus fatos riscados na brancura cuidadosamente engomada,
o incandescer bruto do ferro movido a carvão ascendente;
uma espécie de lume sombrio, o fantasma de um tempo que
__________________________________[deixou de o ser.

E ainda o cenário de chapéus senhoris & chávenas
de elegante "etiqueta" [a risca azul sem alusão à marca]
a acompanhar, desaparecidos desde sempre, como
a distância e o tempo que nos separam desde agora.
Neste instante, apenas o acrílico plástico parece

suportar o peso de uma geração «wireless/wlan»
que cresce adiante, num ritmo que parece fluir
longe do alcance das nossas palavras, no vazio
quieto e tão sóbrio, das nossas próprias mãos.

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